Por Herculano Domício - Jornal Cruzeiro do Vale

Por Herculano Domício

25/11/2009

Especial 1 ano da tragédia

Esperança I

O título da coluna hoje era para ser, tragédia. Preferi este: esperança. Esta é a palavra chave e mágica de todo este contexto que o jornal Cruzeiro do Vale retratou à época e repisa nesta edição, um ano depois. Esperança pede consciência, respeito e mudanças de nós atores responsáveis  por muitos dos resultados registrados há um ano e ameaçadores do presente e futuro. Comparo. A primeira e a última grande tragédia ambiental que me deparei como testemunha em Santa Catarina se assemelham no impacto e nos resultados. A primeira foi à grande enchente de Tubarão nos meados dos anos de 1970; e a última, esta ação natural severa em 2008 que se abateu sobre Blumenau, Gaspar, Ilhota e Luiz Alves.

 

Esperança II

Usurpamos, desconhecemos ou  desrespeitamos todos os sinais e o senso de responsabilidade. Em Tubarão, ainda jovem e no exercício do jornalismo, conheci o impacto, a combinação de fatores naturais e humanos, bem como a surpresa como tudo avançou e se perpetrou. Era quase inarrável. Desta vez, depois da minha experiência pessoal de perder quase tudo nas grandes enchentes de 1983 e 1984 ( e narrá-las por ofício), desta vez, estava à salvo.Todavia, não livre de ainda testemunhar à fúria, o impacto, a combinação de fatores naturais e humanos, bem como a surpresa como tudo avançou, soterrou, modificou e aconteceu em 23 de Novembro de 2008.

 

Esperança III

A enchente do Rio Itajaí Açú sobre o Vale já era algo sob o domínio, conhecimento e previsibilidade do resultado. Foram anos de tragédias, anos de perdas, lutas e adaptação ao fenômeno. Todavia, ninguém estava preparado para uma chuva de Leste, tão intensa, prolongada e persistente. E ela veio. E foi trágica. Fez cair também os métodos, medidas e os conceitos preventivos conhecidos. Além da enchente, outro ingrediente devastador: as encostas, os morros desnudos, ocupados, feridos, desmoronavam-se, desmanchavam-se, soterravam  casas, máquinas, acessos, animais, vidas e principalmente identidades, intimidades e sonhos. Qual um sorvete sob calor, a lama lambuzava os baixios dos vales, isolava, formava nova a geografia das águas,  separando famílias, desesperando impotentes pessoas, estabelecendo-se à tragédia anunciada, mas desafiada e renegada por nós mesmo.

 

Esperança IV

Atos lembram à data, à época, às vidas perdidas e salvas. Mas esses atos devem ir mais além do simbolismo lírico, da saudade, da homenagem, dos heróis, da ideologia, da reverência religiosa. É preciso avançar na consciência, no respeito e na reflexão. Somos parte do problema. Literalmente. A natureza nos pede limites. E frequentemente nos  negamos à evidência. O cidadão e a cidadã precisam compreender esses limites; os políticos devem se abster das concessões para os resultados eleitorais de curto prazo (e que matam); as leis regulatórias devem obedecidas pelos administradores públicos e exigidas, impostas pela promotoria pública e o judiciário (que tendem à concessões sociais) justamente tornando-os mais vulneráveis, mais fracos, menos informados, mais manipulados do que já são por quem tem interesses e se perpetua nas vantagens.

 

Esperança V

Hoje é um dia para celebrar a vida: a dos que sobreviveram, a dos que testemunharam  os avisos e a dos que se comprometem para diminuir os riscos às novas gerações. Hoje é dia de relembrar os nossos erros. Hoje é dia de penitência. Hoje é dia para firmar um pacto contra as tragédias que nós mesmos construímos com a nossa ação, descaso e omissão. Hoje é dia de se reestabelecer à esperança, para assim nos comprometermos do homem do homem com o desenvolvimento. Há pouco a comemorar. Há muito por se construir e mudar a partir das lições que a catástrofe do ano passado nos legou.

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