Negros ainda são minoria em meio a multidão germânica em Gaspar - Jornal Cruzeiro do Vale

Negros ainda são minoria em meio a multidão germânica em Gaspar

19/11/2011

Por: Fernanda Pereira

A cor da pele escura chama a atenção quando Djalma João dos Anjos caminha no meio da multidão. O gasparense negro diz já ter se acostumado a ser ?diferente? e apesar de fazer parte de uma minoria, nunca sentiu na pele as marcas do preconceito racial. Djalma é um dos 1.260 moradores da cidade que são negros. O número é pequeno e representa apenas 2,17% da população total de Gaspar, segundo o Censo 2010.  

Para Djalma, apesar de ser uma cidade colonizada por europeus, com maioria da população descendente de alemães e italianos, Gaspar é uma cidade que sabe conviver com o diferente. ?Não sei se é porque meu pai sempre foi muito conhecido na cidade, mas as portas sempre estiveram abertas para mim, seja na escola ou no mercado de trabalho. Sempre fui tratado como igual?, conta o filho do saudoso Nego Lando.

No Dia Nacional da Consciência Negra, celebrado em todo o país em 20 de novembro, Djalma comemora o fato de nunca precisar fazer uso dos direitos que lhe são garantidos por lei para sentir-se inserido na sociedade.

Diferente de Djalma, Rogério das Neves Souza não nasceu em Gaspar e ao chegar na cidade, no ano passado, percebeu que era minoria no meio de uma multidão germânica. ?Achei diferente, pois sou carioca e lá no Rio de Janeiro há muitos negros. Aqui quase não via negros andando pelas ruas. Mas agora já me acostumei?, relata o garoto de 16 anos. Apesar de ter se inserido na sociedade com facilidade ? ele trabalha e estuda ? Rogério afirma que sentiu que as pessoas o olhavam com diferença quando chegou na cidade. ?Agora já me sinto melhor, mas no começo parecia que todos me olhavam diferente?, conta.

Preconceito na pele

fotopg12secundriocolorMD.jpgSebastião dos Reis também faz parte de uma minoria em Gaspar. O homem de 46 anos e pele morena é um dos 5.107 moradores da cidade considerados pardos pelo Censo do IBGE de 2010.

Apesar de não ser negro, Sebastião sentiu na pele o preconceito ao chegar na cidade, em 1992. ?Eu trabalhava como pedreiro em uma casa na rua Sete e a dona da casa falou para o meu patrão não deixar eu e os colegas sozinhos na casa dela, pois como éramos negros poderíamos roubar alguma coisa. Isso me deixou muito sentido. Sou um homem honesto e a cor da minha pele não tem relação com meu caráter?, relembra Sebastião.

O preconceito já ficou no passado, mas as marcas ainda trazem lembranças ruins para este homem natural de Chapecó, que escolheu a cidade de Gaspar para viver. ?As pessoas falam que não existe mais preconceito, mas na minha opinião existe sim. Acho que ele só está mascarado, por causa da lei. Se não fosse crime ter preconceito acho que todos veriam claramente como ainda há resistência com as pessoas de pele escura?, opina.



Pelo fim do preconceito

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Foi para acabar com preconceitos como o sofrido por Rogério e Sebastião que foi criado o Dia da Consciência Negra. A data tem como objetivo reforçar a importância da cultura negra para a formação da nação brasileira e foi estabelecida em janeiro de 2003. O dia  20 de novembro foi escolhido pois foi neste dia, no ano de 1695, que morreu Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares.

O Dia da Consciência Negra é lembrado todos os anos nas escolas de todo o país, onde nas salas de aula os professores trabalham com os alunos a importância dos negros para a cultura brasileira e a importância da aceitação do outro, sem diferença. Em Gaspar, a Escola Honório Miranda vai receber o coordenador do Movimento Cisne Negro de Blumenau, Lenilso Silva, nesta segunda-feira, 21. Durante todo o dia, a partir das 9 horas da manhã, a escola fará ações em comemoração a data. Segundo a diretora Michela Breda, haverá um desfile afro, e a apresentações de músicas e danças.

Sem preconceito

Na Escola Zenaide Schmitt Costa, que fica no bairro Santa Terezinha, nenhuma programação está agendada para comemorar o Dia da Consciência Negra, porém, os professores sempre trabalham o tema com seus alunos em sala de aula. ?Temos alguns alunos negros em nossa escola, mas eles são minoria. Apesar de poucos, nunca tivemos casos de preconceitos com alunos, há muito respeito e amizade entre eles. O que tivemos foi uma professora, que há muitos anos trabalha conosco e tivemos um caso em que alguns alunos não quiseram participar da aula dela. Mas conseguimos resolver a situação e mostrar para as crianças que preconceito não é legal?, comenta a diretora Sandra Spengler.

Lenita Mariana da Silva é uma das poucas alunas negras da Escola Zenaide Schmitt Costa. A garota de 15 anos revela que já se acostumou a ser minoria na sala de aula. Segundo a garota, ela  nunca sofreu nenhum tipo de preconceito dos colegas de classe. ?Todos são vistos como iguais em nossa escola. Nunca tive problemas por ser negra. Há muita aceitação em nosso meio?, afirma a jovem.

Rua dos pretos

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Apesar de ser uma cidade com moradores predominantemente brancos, Gaspar possui uma rua conhecida popularmente como ?Rua dos Pretos?. A rua fica no bairro Santa Terezinha e é lá que se concentram muitas famílias negras da cidade. O endereço não é exclusivo para pessoas negras, tanto que nos últimos anos muitos brancos se mudaram para o local, mas, contam os moradores que, quando foi criada, a rua tinha apenas famílias negras e por isso o local ganhou este apelido.

O líder Zumbi

O dia da Consciência Negra ? 20 de novembro ? foi escolhido em homenagem à data da morte do líder do Quilombo dos Palmares, Zumbi. Este personagem histórico representou a luta do negro contra a escravidão, no período do Brasil Colonial. Ele morreu em combate, defendendo seu povo e sua comunidade. Os quilombos representavam uma resistência ao sistema escravista e também um forma coletiva de manutenção da cultura africana no Brasil. Zumbi lutou até a morte por esta cultura e pela liberdade do seu povo. A abolição da escravatura, de forma oficial, só veio em 1888. Porém, os negros sempre resistiram e lutaram contra a opressão e as injustiças advindas da escravidão.

Movimento Cisne Negro

Fundado em 21 de março de 2003, o Movimento Cisne Negro tem como objetivo a promoção de ações de combate ao racismo e de promoção da igualdade racial, bem como, a luta pela eliminação de todas as manifestações que agridem os Direitos Humanos. O movimento tem sede em Blumenau, mas também leva orientação e consciência para as demais cidades da região.
Para celebrar a passagem do Dia da Consciência Negra, o grupo organiza uma série de ações na cidade vizinha entre os dias 20 e 26 de novembro, na Furb. As ações do movimento contribuem com a construção, mobilização, divulgação e execução de eventos e campanhas como: o Dia Internacional de Luta pela Eliminação do Racismo, a Semana Municipal de Consciência Negra, o Movimento Brasil Outros 500 Resistência Negra, Indígena e Popular, a marcha à Brasília pelos 300 anos da imortalidade de Zumbi, além da Marcha Zumbi + 10. Com esta atuação, o Movimento de Consciência Negra de Blumenau - Cisne Negro se transformou num pólo efetivo de reflexões e organização dos negros blumenauenses para a luta contra o racismo.

Edição 1334

Comentários

Marclayton
21/11/2011 09:54
Dia da Consciência y e cota x para uma raça. Concordo com a Ana isso gera conflito. Sou pardo ou mestiço bisavô materno era negro. Mas meu bisavô Domingos sempre honrou suas palavras e compromissos mesmo não tendo bigode.
Gaspar é uma cidade hospitaleira e acolhedora e sempre será para pessoas trabalhadoras e sociais. Jamais me sentir desvalorizado, acredito eu que cada um de nós temos a capacidade de livrar ou deixar arraigar o preconceito quer racial quer social. Quem faz o lugar somos nós, sempre haverá diversidade devemos lutar com o nosso carater, trabalho e honestidade.
Ana
21/11/2011 08:49
Sinceramente, criar o dia da consciência negra é uma grande forma de preconceito que o governo criou, se não, por que não existe o dia da consciência ?branca?? Acho que se a pessoa independente da cor ou raça, se der valor, for educada e respeitar as pessoas ela não será tratada com preconceito!
O Djalma é uma dessas pessoas, sempre educado, ele tem seu reconhecimento!
cleber Sidney Reinert
20/11/2011 13:08
Djalma não é apenas por vc ser filho do saudoso nego Lando, mais sim por ser essa pessoa maravilhosa e amigo que vc é que tem respeito de todos, somos amigos e amizade de muitos anos adimira vc é sempre orgulho para mim,vc é exemplo dos negros em nossa cidade preconceito racial to fora parabens amigo e a todos que dizem ser diferentes que na verdade não são e sim são exemplos para todos abraço parceiro.

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