Por Herculano Domício - Jornal Cruzeiro do Vale

Por Herculano Domício

05/08/2008

Lei I

Quando os vereadores de Gaspar começaram a debater e aprovaram a Emenda 6 à Lei Orgânica do Município de Gaspar, escrevi que ela era casuística e visava unicamente encurralar e frear o prefeito de plantão. Arrumei desafetos. Houve até quem dissesse que eu estava a serviço do prefeito. Ele e seus asseclas incondicionais, às vezes, dizem que estou a serviço dos adversários dele. E assim vai. Estou acostumado há mais de 35 anos. É duro ter opinião ou conhecimento.

Lei II

Voltando. Também escrevi que essas tentativas de cassá-lo podiam dar em nada. Eram factóides criados para distrair os eleitores em época de campanha eleitoral. Coisas próprias de adversários ou de quem não têm propostas e ação concreta para a cidade e os cidadãos. Então, mais gente franziu o cenho. Não que eu não concorde com os motivos para a cassação. Ao contrário. Mas entendia que tudo devia ser feito ao seu tempo (fora do embate eleitoral), com fundamento e dentro da Lei existente. E para isso há um rito próprio, prazos, muitos recursos, interpretações, paciência e advogados hábeis no lugar de políticos sedentos de comemorações e resultados imediatos.

Lei III

Pois bem, uma tentativa de cassá-lo já caiu por terra. A própria Comissão Processante alegou falta de provas. Ora, bolas. Falta de provas? Então a Comissão nem deveria ter sido instalada. Um mico. Prova é a essência para se inocentar ou condenar alguém. Todavia, o que está por detrás de tudo isso? Não é exatamente a falta de provas, penso. É o próprio Direito ou a legitimidade desse Direito. A Câmara, segundo advogados acostumados a estes assuntos, está experimentando do próprio veneno. A tal Emenda 6 está lhe retirando a legitimidade jurídica para os atos de cassação que queria, quer ou terá que fazer um dia.

Lei IV

E neste ponto - a de ficar exposta - a Comissão agiu bem e rápido. Tentou disfarçar o nó em que estava metida e se encerrou com uma desculpa. Há um vácuo jurídico para estes casos, incluindo os dois pedidos de cassação ainda em curso. O que vale? O Decreto 201/67 ou a Emenda 6 que o modificou? Por enquanto e liminarmente há uma vitória do prefeito, da tese do advogado que o orienta e do procurador Aurélio Marcos de Souza, independente da desculpa que o outro lado dê. Os detratores do prefeito deram-lhe, gratuitamente, um discurso que ele não tinha. O prefeito agora é vítima. Falta de estratégia dos adversários? Imprudência? Sede de vingança? A princípio, com toda a sinceridade, ingenuidade.

Lei V

O município de Gaspar foi ao Tribunal de Justiça do Estado no dia 18 de julho de 2007 e questionou pontos que entendia inconstitucionais da Emenda 6, entre elas, as fundamentais como prazos e número de testemunhas. Pediu uma Medida Liminar. No dia 28 de abril deste ano, o procurador de Justiça do Estado, Raulino Jacó Brüning, no parecer que deu ao desembargador relator do caso, Trindade dos Santos, reconheceu-as e recomendou a Cautelar até a análise e julgamento do mérito que acontecerá neste 20 de agosto.

Lei VI

Agora atentem para as datas e me desculpem o juridiquês. Diante da iminente possibilidade de cassação baseada nos preceitos e ritos duvidosos da Emenda 6 que está em julgamento no Tribunal, o prefeito entrou na Vara da Comarca de Gaspar com um Mandato de Segurança contra os atos da Comissão Processante da Câmara. Obteve êxito parcial. Como o tempo se esgotava, o prefeito apelou com um Agravo de Instrumento para provocar e acelerar uma decisão emergencial do Tribunal sobre o questionamento que fez de inconstitucionalidade desta Emenda.

Lei VII

No dia 15 de julho, o Juiz relator do agravo Robson Luz Varella, concedeu a tutela antecipada para o Recurso, determinando que fosse observado o prazo de 90 dias para a conclusão dos trabalhos da Comissão, como determina o art 5º. VII, do Decreto-Lei 201/67. É que a dita Emenda 6 alterou esse prazo em até 120 dias. No dia 7 de julho, 99 dias depois de instalada, curiosa e possivelmente oito dias antes da Tutela antecipada concedida, a Comissão Processante decide repentinamente encerrar os seus trabalhos alegando falta de provas. Estranho: o anúncio público da decisão da comissão só aconteceu no dia 28 de julho, ou seja, exatos 120 dias após a instalação da Comissão Processante (conforme permite a Emenda 6) e 13 dias depois decisão do Juiz ( que a princípio anularia todos os atos da Comissão pelo vício). Coincidências ou esperteza?

Lei VIII

Falta de provas ou uma emergencial saída "técnica"? Ou não chamar a atenção para a fragilidade jurídica e ao mesmo tempo confundir os leigos em Direito Constitucional e Administrativo? Mesmo que tivesse provas e substanciais, qualquer decisão da Comissão Processante corria o risco de ser declarada nula diante dos sucessivos posicionamentos do Tribunal sobre a Emenda 6.

Lei IX

O procurador da Câmara, Pedro Paulo Schramm discorda frontalmente de mim e das alegações da defesa do prefeito. Contudo, admite que a Emenda contém um vício no caso do número das testemunhas e que isso podia e pode invalidar os processos. Terá que adequá-la. É um bom começo. Disse-me que desconhecia a decisão liminar sobre os 90 dias. Mas, ela é pública e disponível, principalmente sendo ele uma das partes interessadas. É que Pedro Paulo e os vereadores apostam tudo no julgamento do Pleno do Tribunal no dia 20 para ver quem tem razão no mérito sobre este assunto: valerá o Decreto Lei 201/67ou a Emenda 6? Então, até lá, parece ser uma disputa entre dois Poderes, suas assessorias jurídicas e torcidas partidárias. Tem operador do direito que se vestiu de árbitro, juiz, jurista e doutrinador para satisfazer a uma disputa de poder.

Lei X

O que é Lei? Segundo o dicionário Houaiss "é uma regra, prescrição escrita que emana da autoridade soberana de uma dada sociedade e impõe a todos os indivíduos a obrigação de submeter-se a ela sob pena das sanções". Ou seja, ela é que nos torna iguais. E para mudá-la é preciso ter fundamento filosófico e doutrinário, além de amparo sistemático, legal e constitucional. O casuísmo retira da Lei a força, a legitimidade e pode anular atos amparados por ela. Esta Emenda 6, do jeito que as coisas vão, pode estar com os dias contados.

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