Por Fernanda Pereira
As casas coloridas formam uma fila uniforme no terreno do bairro Gaspar Mirim e revelam a concretização de um sonho esperado por dezenas de famílias desabrigadas pela tragédia de 2008.
Dois anos depois da catástrofe natural que ceifou vidas e desabrigou centenas de pessoas, as moradias estão em processo de finalização e deverão ser entregues para os novos moradores nos próximos dias, porém ainda há muito trabalho para ser executado no local.
Muitas casas ainda estão sem pintura, sem piso, sem forro, sem banheiro. Todo o material para o acabamento foi doado pelo Município, porém, cabe às próprias famílias a execução da mão-de-obra e cada novo morador se vira, do jeito que pode, para deixar sua nova casa pronta para o Natal.
Neide Maba é uma destas moradoras. Ela e o marido trabalham no término da pintura e instalação dos banheiros para poder se mudar assim que a diretoria de Habitação liberar as chaves. ?Estou muito ansiosa para ir para a minha casa. Nem me importo com a lama que se formou por lá. O que quero é o meu cantinho para sossegar com minha família. Nem acredito que vou poder passar o Natal na minha casa?, conta.
Infraestrutura
Heriberto Kuntz, diretor de Habitação, revela que os construtores correm contra o tempo para finalizar a instalação de fossa e filtro em todas as 30 moradias prontas e a Administração Pública, responsável pela infraestrutura do local, luta contra o clima para poder arrumar o terreno para a chegada de seus moradores. ?Estamos apenas esperando a chuva parar para poder retirar todo o barro que se formou no local e colocar macadame, para que as pessoas possam caminhar pelo local, hoje coberto pela lama?, explica Heriberto.
A mudança das famílias para suas novas casas depende ainda da liberação da Companhia de Habitação, Cohab, que deve vir a cidade até esta sexta-feira para fazer uma vistoria no local.
Famílias serão acompanhadas
No terreno do Gaspar Mirim foram construídas 30 casas com recursos do Ministério da Integração e outras 27 estão em processo de construção através do Instituto Ressoar. Outras duas também estão sendo erguidas no local através do Instituto Guga Kuerten, somando um total de 59 novas moradias.
Heriberto Kuntz, diretor de Habitação, explica que o Município vai iniciar nos próximos dias um trabalho social com as famílias que irão se mudar para o local, instruindo sobre regras de conduta e cuidados necessários para preservar o loteamento. ?Queremos fazer deste um loteamento sustentável, onde todos estejam cientes dos cuidados com o meio ambiente e com o bom convívio social?, destaca.Preparado para fechar suas portas
As paredes riscadas, o portão quebrado, e a cozinha depredada revelam o total descuido das 36 famílias que nestes dois anos moraram no abrigo municipal montado para receber as vítimas da catástrofe.
Com a entrega das primeiras moradias, o abrigo está em processo de desocupação e as últimas 11 famílias que residem no local se preparam para ir para suas novas casas, ou para o aluguel, como é o caso de Maria Dolores dos Santos.
Dolores integra uma das quatro famílias que não foi contemplada com as casas do Gaspar Mirim e vai receber ajuda do Município, através do programa Renda Mínima, para pagar aluguel até que as casas do Instituto Ressoar sejam entregues. ?Eu ainda estou procurando uma casa para alugar, mas vou encontrar. O que espero é que a promessa de que receberei uma casa seja cumprida?, afirma a abrigada.
Edinei da Silva, secretário de Desenvolvimento Social que deixou o cargo nesta semana, explica que a distribuição das casas obedeceu a critérios sociais e garante que todas as famílias que estão indo para o aluguel vão receber suas casas em breve, com exceção de uma família, que é um caso especial. ?Este processo de desocupação do abrigo está sendo feito de maneira bem ordeira. Avisamos as famílias e elas só vão sair de lá quando as casas forem liberadas. Já para as pessoas que vão morar de aluguel, estamos agilizando suas mudanças. O que queremos é promover uma moradia digna para todos?, ressalta.
Abrigo
O abrigo municipal foi montado em fevereiro de 2009, quando as famílias que estavam morando nas escolas foram levadas para um único local, alugado pelo município. No início 36 famílias moravam no abrigo, que era coordenado pela equipe da Assistência Social, que diariamente estava no local para promover a integração e alojamento dos desabrigados e garantir a distribuição dos alimentos recebidos em forma de doação.
Aos poucos as famílias cujo moradias não estavam interditadas foram voltando para suas casas até que o abrigo ficasse com as atuais 11 famílias que ainda residem no local. Convívio difícil
A sensação das 11 famílias que durante estes dois anos moraram no abrigo municipal é de alívio. Depois de muita confusão e desentendimento, elas poderão ter suas próprias casas. ?Nem acredito que vou para a minha casa. Estes dois anos aqui foram terríveis, as pessoas são muito descuidadas, este lugar esta sempre sujo, por mais que a gente limpe?, comenta Iracema Novaes dos Santos, que mora com o marido e os cinco filhos em um dos apartamentos que ficam ao lado do galpão alugado pela prefeitura. Iracema era moradora do Sertão Verde e viu sua casa ser destruída pela força do barro que desceu dos morros.
Juliane Vigarane também espera ansiosa pela mudança para sua nova casa. A jovem mora no abrigo com os pais e dois irmãos e conta que foram dois anos muito difíceis para todos. ?No começo eram muitas pessoas, ninguém se conhecia e ninguém se entendia?, relata a jovem, que já foi várias vezes ver de perto a nova casa no loteamento do Gaspar Mirim.
Lindacir é a única que não ganhará casa
A única família que não vai receber uma moradia do Município é a de Lindacir Monteiro. Ela está no abrigo desde a tragédia e no início foi impedida de retornar para sua casa, no Jardim Primavera, pois a mesma estava interditada. Porém, há alguns meses, um novo laudo da Defesa Civil liberou a casa para o retorno da família, porém Lindacir está receosa de se mudar para o local com os quatro filhos pequenos.
?Minha casa está cada dia mais ameaçada. Basta ir até lá para ver. Não vou morar lá e colocar meus filhos em risco?, afirma.
Diante da negação de Lindacir, o Município propôs que ela fosse contemplada com auxílio financeiro para aluguel, através do programa Renda Mínima, porém, ela se recusa a receber o benefício. ?Não vou aceitar pois eles vão me dar este auxílio por um tempo e depois vou ter que me virar. Não vou aceitar morar de aluguel porque eu tinha a minha casa. Muitas famílias estão ganhando casa e nem tinham moradia própria. Por que eu não posso ser beneficiada também??, questiona a abrigada.
Enquanto o impasse da família de Lincadir não é definido, ela continua morando no abrigo, mas sem saber até que dia poderá ficar com os quatro filhos no local.
edição 1256
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