A vida de Frei Bruno Linden, frade franciscano que trabalhou em Gaspar no início do século passado e que está em processo de beatificação no Vaticano, foi detalhada em livro. Escrito por frei Clarêncio Neotti, o livro ?Frei Bruno Linden: Tudo para Todos? se baseia em pesquisas históricas, documentos, livros de registro e também em relatos de pessoas que conviveram com Frei Bruno para recontar os passos do ex-pároco gasparense.
A biografia de Frei Bruno será lançada oficialmente em Gaspar na próxima quinta-feira, dia 13, às 20h, no Salão Cristo Rei. A solenidade organizada pela Paróquia de Gaspar terá sessão de autógrafos com o autor do livro, Frei Clarêncio Neotti. Ele chegou a conhecer Frei Bruno e hoje reside em Vila Velha (ES), onde é Vigário Paroquial no Santuário do Divino Espírito Santo. Jornalista e escritor, é autor de diversos livros religiosos.
Filho de Humberto Linden e Cecília Golden, Frei Bruno Linden nasceu em Dusseldorf, na Alemanha, em 8 de setembro de 1876. Em 1894, ainda como noviço, aportou em Salvador, na Bahia, de onde logo partiu para o sacerdócio, estudando filosofia e teologia em Petrópolis. Entre 1902 e 1906, atuou como superior e coadjutor na Paróquia de Gaspar. Trabalhou também em São José, Não-Me-Toque (RS), Rodeio e Xaxim. Já com 80 anos, foi para Joaçaba, onde viveu até 1960, quando morreu vítima de infarto.
Entre os milagres atribuídos a ele estariam diversas curas instantâneas, com bênção e imposição das mãos. O organizador do lançamento da biografia de Frei Bruno em Gaspar, Aloir Arno Spengler, ressalta ainda que ele teria o dom da bilocação, o poder de estar em dois locais simultaneamente, mesmo carisma atribuído a Santo Antônio de Pádua. ?É muito importante que esse processo de beatificação venha avançando, mas para o povo ele já é santo?, define.
No ano passado, o Vaticano concedeu o ?Nihil obstat? (nada obsta) para o pedido de beatificação de Frei Bruno Linden. O documento permite que o processo avance junto à Santa Sé. Na Igreja Católica, a beatificação permite que sejam prestados cultos públicos e é considerada uma etapa anterior à canonização. A biografia escrita por Frei Clarêncio deve ser uma das peças do processo de beatificação de Frei Bruno.
Entrevista
Em entrevista ao site da Paróquia de Gaspar, o autor deu detalhes sobre o processo de produção do livro. Confira abaixo:
Que balanço o senhor faz do trabalho?
Frei Clarêncio Neotti ? Quando, em fevereiro de 2012, em nome do Definitório, Frei Estêvão me convidou para escrever a biografia oficial de Frei Bruno e me disse que o convite vinha também em nome de Dom Mário Marquez, fui primeiro ao arquivo provincial ver o que havia sobre ele. Pouquíssima coisa. Nem mesmo os documentos essenciais, como batistério, profissão e ordenação lá encontrei. Não sou historiador, mas sempre tive faro histórico, que cresceu ao longo dos últimos anos pela experiência amorosa de escrever necrológios de confrades. Esta experiência me ajudou muito.
Como foi o início da pesquisa?
Frei Clarêncio ? Saí à procura de folhetos, artigos e livretos publicados sobre ele. Vi que todos repetiam textualmente o belo necrológio escrito ainda em 1960 por Frei Edgar Loers, último guardião de Frei Bruno, em Joaçaba. Ora, nesse necrológio há imprecisões de datas e transferências, repetidas pelos copiadores. Em nenhum escrito sobre Frei Bruno encontrei, por exemplo, sua transferência de Gaspar para Petrópolis com o cargo de pároco em Cebolas. Isso me fez prestar muita atenção e checar com seriedade todas as informações correntes. Quando o livro estava em fase final, mandei os originais ao Padre José Artulino Besen, o historiador da Igreja em Santa Catarina que, por feliz acaso, é pároco em São José, sucessor, portanto, de Frei Bruno, e também a Frei Ary E. Pintarelli, pedindo a ele um olho severo sobre a clareza do texto. Sou grato aos dois pelas correções e achegas.
Quanto tempo de pesquisa o livro demandou?
Frei Clarêncio ? Com a obediência do Definitório e a anuência compreensiva do meu guardião Frei Paulo Pereira, logo depois da Romaria de março de 2012, quando me encontrei com o Postulador Geral Frei Gianni, que me deu claras instruções de como fazer a coleta de dados, fui aos arquivos da Arquidiocese de Florianópolis, da diocese de Petrópolis, da diocese de Joinvile, da Casa Geral das Irmãs Catequistas, dos conventos de Rodeio e Xaxim. Fui aos arquivos das paróquias pastoreadas por Frei Bruno. Fotocopiei ou fotografei tudo o que encontrei. Antes de ir às paróquias de Não Me Toque (RS) e Xaxim (SC), passei por enfarto, que anulou muitos dias de possível trabalho. Quando, em outubro de 2013, foi constituído o processo e eu fui oficialmente nomeado presidente da Comissão Histórica, eu já tinha recolhido os possíveis documentos em torno de Frei Bruno, sobretudo todos os Livros de Tombo escritos à mão por ele, alguns livros de crônicas, quando ele foi o cronista da casa, e muitas cartas.
Os materiais disponíveis lhe surpreenderam?
Frei Clarêncio ? A essa altura eu tinha lido tudo o que encontrara sobre as paróquias e fraternidades onde ele trabalhara (...). Vi, então, que havia farto material, com algumas lacunas, é verdade, mas suficiente para escrever a biografia de Frei Bruno dentro da Igreja e da sociedade de seu tempo. Escolhi como método a sequência temporal dos fatos. E percebi logo que os podia basear nos Tombos escritos por ele e nas Crônicas das Fraternidades. Em momento nenhum me esqueci de que a biografia era dirigida ao povo devoto. Por isso mesmo, procurei trabalhar com uma linguagem linear, de frases curtas. Daí também o acréscimo de uma centena de rodapés, ora para explicar ao povo o jargão religioso-curial, ora para pôr o leitor dentro da história da igreja local ou do município. Não podemos esquecer que Frei Bruno é da geração pioneira em todas as paróquias em que trabalhou. Estou de fato feliz de ter terminado esta biografia, item necessário para o processo de Beatificação e Canonização de Frei Bruno.
Depois desse trabalho, como o senhor define Frei Bruno?
Frei Clarêncio ? Frei Bruno me surpreendeu. Como digo no livro, eu o conheci. Mas nunca convivi com ele. Surpreendeu-me pelo retrato que emergiu dos Livros de Tombo, retrato que coincide com os depoimentos dos que o conheceram mais de perto. Tive a ousadia de tentar fazer-lhe o retrato psicológico-espiritual-pastoral através de substantivos que ressaltam dos depoimentos. No livro aparecem apenas alguns depoimentos ou partes deles. No processo teremos a íntegra dos depoimentos, a íntegra das cartas que conseguimos, a íntegra dos Livros de Tombo e das Crônicas. Foi só no fim, quando o livro estava pronto, que fixei o subtítulo, uma expressão de São Paulo, ?Tudo para todos?.
Mas eu tinha posto numa folha à parte outros possíveis subtítulos, como: ?O santo das famílias?, ?O homem da misericórdia e da penitência?, ?Quando bondade e bênção se encontram?, ?O homem do bom senso?, ?Deus olhou para a humildade de seu servo?. De fato, a família foi a maior preocupação pastoral de Frei Bruno. Num tempo de crise acentuada da família, como é o atual, o carinho pessoal e personalizado de um Frei Bruno talvez fosse a melhor medicina para o equilíbrio caseiro.
O que mais te impressiona na vida dele?
Frei Clarêncio ? Vou usar uma palavra desconhecida do mundo moderno. Impressiona-me Frei Bruno como asceta. Que pode ser sinônimo de penitente. Que pode ser sinônimo de disciplinado. Que pode ser sinônimo de congruente. Que pode ser sinônimo de rígido consigo e compreensivo com os outros. Que pode ser sinônimo de obediente sem glosa, mas com acentuado bom senso. Impressionou-me muito o fato de nunca ter uma palavra negativa sobre confrades ou fatos acontecidos e por ele anotados nos Tombos e nas Crônicas. Também me impressionou seu conhecido desapego no vestir, no comer, no direito à vontade própria e no fato de ter renunciado por escrito ao direito de visitar seus parentes na Alemanha. (...)
O que representa para a Província este processo de beatificação?
Frei Clarêncio ? Penso que em primeiro lugar é um dever de justiça para com toda uma geração de missionários franciscanos alemães, muitos deles mortos em fama de santidade e rodeados do carinho agradecido do povo. Pelo que sei, vários deles podiam ir para o altar com Frei Bruno. Lembraria Frei Januário Bauer, Frei Lucínio Korte, Frei Plácido Rohlf, Frei Rogério Neuhaus, Frei Solano Schmitt, Frei Zeno Wallbröhl, Frei Modesto Blöink, Frei Luís Reinke, Frei Policarpo Schuhen, Frei Domingos Schmitz, Frei Heriberto Behr, esquecendo outros mais novos.
Em segundo lugar, devemos reconhecer que a Província restaurada não fez grandes esforços em beatificar seus filhos. Frei Bruno foi um clamor do povo. Bendito clamor! Em terceiro lugar, sempre a meu modo de ver, o processo de beatificação de Frei Bruno, que por 19 anos foi modelo do noviciado, pode significar um novo amanhecer vocacional ao lado de um profundo e sério agradecimento a Deus pelo nosso passado.
Em quarto, mas não último lugar, a beatificação de Frei Bruno poderá ou deverá rejuvenescer, aquecer e fortificar nossos compromissos com o carisma franciscano vivido em benefício do povo, sempre em estreitíssimos laços com a Igreja local.
Edição 1638
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