Por Carlos Rocha dos Santos, jornalista, publicitário, professor e gestor de imagens
Permitam-me compartilhar uma experiência pessoal, que me inspirou a escrever este artigo. Recentemente retornei à sala de aula, após alguns anos afastado do ensino superior como professor universitário. Sou filho de professores, por parte de pai e mãe, e sempre acreditei na máxima de que "quem ensina, aprende duas vezes". Essa troca de conhecimentos com os alunos é uma das riquezas da academia, especialmente em áreas dinâmicas como a publicidade, o jornalismo e a comunicação. Ao voltar a lecionar no curso de Produção Audiovisual, algo chamou minha atenção de forma marcante: numa turma de terceira fase, mais da metade dos estudantes são mulheres.
Essa cena me despertou interesse, pois ao lecionar na mesma graduação cerca de 12 anos atrás, a realidade era bem diferente: a maioria dos alunos era formada por homens. Essa mudança não é apenas um dado curioso, mas um símbolo claro da transformação que estamos vivendo: as mulheres estão conquistando espaço no mercado audiovisual e se tornando protagonistas de uma nova era.
No Brasil, as mulheres são 51% da população, segundo dados do IBGE, mas ocupam apenas cerca de 20% das direções e 25% dos roteiros no audiovisual, de acordo com a Agência Nacional do Cinema (Ancine) — um descompasso que revela os desafios para assumir o comando. Apesar de tanto talento e formação, muitas esbarram em preconceitos e na falta de oportunidades. Por muito tempo, acreditou-se que certas funções técnicas “pesadas” eram exclusivas dos homens, o que afastou as mulheres de postos como direção de fotografia e som. Mundialmente, ainda é raro ver mulheres recebendo o mais alto prêmio de direção, como o Oscar, o que revela as barreiras que persistem.
Felizmente, esse cenário vem mudando. A cada ano, mais mulheres desbravam a área audiovisual e mostram sua força em diferentes formatos — do cinema e das séries de streaming aos vídeos para redes sociais e podcasts. Essa transformação é impulsionada pela coragem das profissionais e por iniciativas do setor voltadas à diversidade. Produtoras e coletivos têm se mobilizado para abrir espaço, como o movimento Free The Bid na publicidade, conforme destaca o portal Meio & Mensagem. O resultado é um mercado mais aberto ao talento feminino, pronto para se renovar com novos olhares.
Um marco importante para o audiovisual brasileiro aconteceu na premiação do Oscar 2025, quando o Brasil venceu na categoria Melhor Filme Internacional com a obra Ainda estou aqui. Embora dirigido por um homem, o filme se destaca pela força feminina presente tanto na narrativa quanto na atuação e produção, sendo protagonizado por uma mulher que conduz a história com profundidade e intensidade. Essa conquista evidencia que o cinema brasileiro tem ganhado visibilidade e que as mulheres estão cada vez mais presentes e essenciais na construção dessas narrativas.
No entretenimento de cinema e televisão, a presença feminina cresce e traz perspectivas renovadas às telas. Filmes e séries com diretoras e roteiristas no comando apresentam narrativas mais diversas e representativas. Cada obra liderada por uma mulher reforça que o lugar dela é onde ela quiser — inclusive no papel de criadora por trás das câmeras.
Nas redes sociais, muitas criadoras de conteúdo se tornaram referências, produzindo vídeos para Reels, TikTok, YouTube e mais. Segundo levantamento da YouPix, mulheres dominam a produção de conteúdo para redes sociais, especialmente em nichos como comportamento, humor e moda. Ao compartilhar conhecimento, humor ou vivências, elas acumulam milhões de seguidores e provam que a voz feminina é forte nesse meio. Influenciadoras inspiram outras mulheres a se expressarem, tornando a comunicação online mais humana e plural.
No universo dos podcasts, também vivemos a ascensão das vozes femininas. O que antes era um reduto majoritariamente masculino hoje se diversificou: multiplicam-se os programas de áudio apresentados e produzidos por mulheres. Em cerca de uma década, a participação feminina em podcasts brasileiros saltou de 11% para 27%, conforme aponta a Associação Brasileira de Podcasters (AbPod). Um marco dessa tendência foi o podcast "Mamilos" (lançado em 2014 por duas jornalistas), que virou referência e abriu caminho para muitas outras iniciativas. Hoje, é inspirador ver tantas mulheres conduzindo podcasts de sucesso, conectando-se a audiências fiéis e trazendo novas discussões à tona.
Toda essa evolução comprova que a comunicação audiovisual fica mais rica quando há diversidade. Seja em grandes projetos de entretenimento ou na comunicação institucional das empresas, a atuação feminina traz um fôlego novo — mais empatia e representação, sem perder a criatividade e a excelência. Todos ganham: o público mais representado e o mercado mais criativo.
31/01/2025
20/12/2024