Almoço de domingo em família - Jornal Cruzeiro do Vale

Almoço de domingo em família

17/08/2010 08:44

Esperava ansioso pelos os almoços de domingo. Nada como a comidinha da mãe, principalmente no fim de semana que era mais elaborada. O cardápio não mudava muito de uma semana para outra e invariavelmente ela fazia frango frito ou assado acompanhado de farofa, arroz, maionese e muita salada.


Dona Marlene faleceu prematuramente. Eu tinha apenas 13 anos e ela 44 quando nos deixou. Mesmo com poucos anos de convívio, até onde me lembro, esses almoços de família eram como rituais. Os cinco irmãos tinham que estar a postos ao meio dia para sentaram-se à mesa, enquanto mamãe arrumava-a caprichosamente. Hummm...a comida fumegando, aquele cheirinho delicioso, água na boca e uma vontade de avançar na coxa dourada e visivelmente crocante.


Ai, ai, ai se ousasse. O chefe da família ainda não estava na mesa. A cabeceira ainda estava vazia. Só quando o pai sentava é que podíamos nos servir. Porém apenas das guarnições, pois o prato principal, só após Seu Jacques inaugurá-lo. Por sorte ele sempre pegava o peito, deixando as coxas para os mais rápidos dos irmãos. Eu sempre conseguia a minha, já que estrategicamente me sentava o mais perto possível da travessa.


Hoje muita coisa mudou. Agora eu sou o chefe. Não de uma grande família, muito menos de família grande. Apenas eu, minha namorada e uma filha, que evidentemente não é filha da minha atual companheira. Uma legítima família moderna. Ahhh... Esqueci o cachorro. Como poderia. O único ao qual imponho alguma autoridade.
Os almoços de domingo, nem de longe lembram aqueles da minha infância. Minha herdeira raramente está comigo aos domingos. Se não está com sua mãe ou com algum parente, está na casa de amigas. Mas quando está na minha casa, quanta diferença...


Ainda tento manter um pouco daquela mística do almoço em família, mas agora, só para começar, sou eu quem pilota o fogão. Quando sirvo a mesa, mal dá tempo de colocar o alimento lá, minha adorável filha ataca com a voracidade de um animal selvagem. Além disso, normalmente escuto protestos a respeito do menu ? e olha que eu me garanto na cozinha e adapto a refeição para o seu gosto juvenil.
- Ahhh pai, não tem batata frita! Devíamos ter ido ao shopping. Diz a desaforada já sentada no sofá em frente à televisão.


Sei que os tempos são outros e acredito que muito do que acontece tem relação com a minha conivência em função da culpa de não estar sempre presente. Conversando com amigos, sei que não padeço sozinho. Às vezes penso que esse tipo de coisa ocorre em função da dissolução da família, mas amigos casados relatam situações similares. Entre erros e acertos, tento educá-la dentro dos valores que meus pais me ensinaram, mas o adolescente de hoje é um problema sério e quase insolucionável. São extremamente egoístas e egocêntricos.


Observando-os fico assustado. O respeito acabou. Seja pelos pais, pela família, pelos professores, pelos mais velhos, pelas instituições. Fúteis, superficiais, vivem num mundo particular de faz-de-conta onde são príncipes e princesas incompreendidos. Acham que o mundo gira em torno de seus umbigos.


Para piorar, leis que restringem o pátrio poder da palmada e estatutos que só prevêem direitos aos monstrinhos. Faltam limites, mas como impô-los? Que armas utilizar para combater os veículos de comunicação que deturpam cada vez mais os valores tradicionais?  Psicologia, conversa, castigo? Quem tiver uma solução eficaz, por favor, manifeste-se.


Por enquanto, vou para cozinha e preparo o frango. O consolo é que agora escolho a parte que eu quiser. Só que o sabor...


Michel Jaques - michel.jaques@yahoo.com.br

edição 1221

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